Relida é uma revista gratuita independente que tem como objetivo colocar em circulação textos já publicados.
C O N C E I T O
Durante a Festa Literária de Paraty a revista piauí faz uma seleção de alguns textos publicados durante o ano e os republica em uma edição especial e gratuita. Isso de certa maneira cristaliza esses textos. A Relida é isso. Escolher somente textos já publicados e colocá-los de novo em circulação editados em forma de revista gratuita. E com isso tentar potencializar as idéias e, principalmente, a beleza contida neles.
O nome “relida” é uma referência ao termo “revista” porém reforça que aqui os assuntos, ou melhor, os textos, não estão sendo revistos, comentados ou analisados, mas apenas sendo republicados para que eles sejam lidos ou relidos.
S E L E Ç Ã O
Na primeira edição da Relida, os textos republicados não foram exatamente selecionados mas, na verdade, o que aconteceu foi o oposto: o conjunto deles é que foi o motivo para existir a revista.
Na época em que concebi o projeto da Relida eu estava lendo bastante e recorrentemente sentia a vontade de compartilhá-los, entregá-los mesmo para que amigos os lessem e esse primeiro conjunto de 6 textos tem apenas esse traço em comum.
Na segunda edição a ideia foi basicamente a mesma, no entanto ela acabou tendo, por acaso, o número 2 como um elemento compartilhado entre os textos, como escrevo no próprio editorial da edição: ”Calligaris fala da relação a dois citando dois livros para tal; Néstor F. demonstra que em algumas relações apenas dois não é suficiente; Agnaldo Farias fala de um dos dois velhinhos que vêm falando mal da arte contemporânea (o outro é o Ferreira Gullar) e Alan Pauls fala de um dos pares mais difíceis, pai e filha”.
Já na terceira edição a seleção se deu de forma colaborativa. Pedi a seis amigos aos quais eu havia presenteado as duas primeiras edições da Relida que recomendassem um texto cada e estes foram os textos publicados.
Infelizmente estes foram os únicos três números publicados até então, mas as ideias de seleção já foram muitas e são, na verdade, infinitas: textos publicados por uma editora específica, textos sobre mãe, textos em espanhol, cartas publicadas, textos sobre algum esporte específico, enfim, projetos que porventura um dia virão a se tornar novas edições.
F O T O S
Outra característica evidente da Relida é o uso das fotos, tanto em relação ao formato em que elas aparecem quanto à forma que elas aparecem na revista.
O formato da página, 90x265mm, gera uma proporção extremamente vertical que é incomum no campo da fotografia, no entanto esse recorte sempre é resultado de meia foto da tradicional proporção 3x4, aproximadamente.
Esta “meia” foto vem de uma imprecisão usual na encadernação de revistas e que é resolvido na Relida de uma forma interessante.
Pelo fato da Relida ser encadernada através de dois grampos na lombada do conjunto das folhas de papel dobradas ao meio na vertical, a “espinha” das folhas — isto é, o meio delas, onde está a dobra — diversas vezes desliza para os lados. Isto faz com que, se a lâmina (a folha de papel antes da dobra) deslizar para o lado, um pedacinho da página 5 pode aparecer na página 40, por exemplo.
Pelo fato da encadernação ser artesanal, esta imprecisão ocorreria inexoravelmente. Assim, se uma única lâmina fosse composta por foto e texto a chance de um filete de foto aparecer na página de texto ou vice-versa era absoluta.
A solução para esse eminente erro foi o de trabalhar com as fotos inteiras na lâmina, fazendo com que ela apareça em duas páginas diferentes, sendo que cada página contém um dos lados da mesma foto. Assim, o possível deslizamento da lâmina não configuraria um problema.
Este recurso, aparentemente simples, na verdade requere um arranjo editorial complexo. Isto porque ao decidir onde a foto irá aparecer em um momento da publicação — por exemplo na página 10 de 52 — isto automaticamente faz com ela esteja, imperiosamente, na página correspondente à lâmina em que ela se encontra — página 43, retomando o exemplo — o que faz com os textos publicados tenham que se acomodar nesses intervalos de fotos, digamos assim.
Essa condição prévia combinada com algumas outras — nunca existirem dois textos diferentes na mesma dupla, a massa de texto sempre terminar na última linha da mancha de texto — faz com que o projeto gráfico da Relida seja uma espécie de quebra-cabeça proveniente de um rigor intrínseco à publicação.
D I A G R A M A
O diagrama da Relida é, por outro lado, extremamente simples: página de 100x295mm com margens de 20mm em todos os lados, gerando uma mancha de texto de 60mm de largura, com a numeração da página fora da mancha. A entrelinha é de 5mm.
No entanto, como já apontado, os valores reais da publicação acabam diminuindo um pouco (aproximadamente 97% do tamanho original) devido ao ajuste da impressora caseira jato de tinta em que as revistas são produzidas.
P R O J E T O G R Á F I C O
Partindo do diagrama e do par de fontes Gotham e Minion, o projeto gráfico consiste em usá-las de forma restrita porém criativa.
A fonte de texto Minion aparece somente na sua versão regular ou itálico. A fonte de destaque Gotham aparece nos títulos em único tamanho de corpo (a saber, 40pt) e somente na versão Black; também em único corpo (20pt) e na versão Extra Light para os autores; na capa e na contra-capa o nome “Relida” e o número da edição aparecem na versão Bold da mesma fonte no corpo 160pt ambos e as informações complementares em Gotham Light 10pt. As capitulares pelo texto também são em Gotham Bold, mesmo peso da utilizada no nome da revista.
Novamente aqui o processo é de estabelecimento de limites e a partir deles ir em busca da criação através de alinhamentos, espaçamentos e disposições das informações na página. Ao mesmo tempo a vontade é fazer com que a aparência das palavras não se sobreponha ao que elas dizem, isto é, evitar um design gráfico ensimesmado e ir em direção a uma estratégia que privilegie o texto e a sua legibilidade acima de tudo.
F U T U R O
Falar da Relida é falar de muitas coisas que acredito enquanto diagramador. É falar de fontes consagradas, de economia de soluções, de massa de texto. É principalmente falar de rigor estético, de seriedade em relação ao projeto e de respeito em relação à palavra escrita.
Ao mesmo tempo, a Relida se configura quase como um projeto anônimo pelos mesmos motivos: fontes que podem ser consideradas banais, aplicações simples, branco e preto em papel comum na impressora caseira.
Como uma grande parte de projetos que surgem individualmente, este projeto chegou a se imaginar de forma colaborativa e até coletiva onde pessoas pudessem, num primeiro momento, imprimir suas próprias Relidas em casa e futuramente até elaborar novas edições de forma independente.
No entanto, a demanda por conteúdo, ainda que pequena, acabou se tornando difícil de ser suprida apenas por mim e a Relida ficou apenas com estas três edições. Até hoje.
Mesmo com ela não tendo brotado de fato e crescido em vários números, ela foi semente indireta de outras coisas, inclusive da Editora Canhoto. A lida de uma publicação é incerta, mas enquanto se publicar e se ler, a Relida vive, ainda que em repouso. A vontade de reler resiste.
F I C H A T É C N I C A